Artes Visuales
Gil Vicente
Pouco se sabe sobre a vida de Gil Vicente. Pensa-se que terá nascido por volta de 1465, em Guimarães ou algures na Beira. Duas vezes casado, teve cinco filhos, dos quais os mais conhecidos são Paula Vicente, que deixou fama de uma mulher invulgarmente culta, e Luís Vicente, que organizou a primeira Compilação das obras de seu pai.
No início do século XVI encontramo-lo na corte, participando nos torneios poéticos que Garcia de Resende documentou no seu Cancioneiro Geral.
Em documentos da época há referência a um Gil Vicente, ourives, a quem é atribuída a famosa Custódia de Belém (1506), obra-prima da ourivesaria portuguesa do século XVI, e a um Gil Vicente que foi "mestre da balança" da Casa da Moeda. Alguns autores defendem que o dramaturgo, o ourives e o mestre de balança seriam a mesma pessoa, mas até hoje não foi possível provar isso de forma incontestável, embora a identificação do dramaturgo com o ourives seja mais credível, dada a abundância de termos técnicos de ourivesaria nos seus autos.
Ao longo de mais de três décadas, o nosso Gil Vicente foi um dos principais animadores dos serões da corte, escrevendo, encenando e até representando mais de quarenta autos. O primeiro, o Monólogo do Vaqueiro (Auto da Visitação), data de 1502 e foi escrito e representado pelo próprio Gil Vicente na câmara da rainha, para comemorar o nascimento do príncipe D. João, futuro D. João III. O último, Floresta de Enganos, foi escrito em 1536, ano que se presume seja o da sua morte.
O Auto da Sibila Cassandra, escrito em 1513, introduz os deuses pagãos na intriga e por isso é considerado por alguns como o marco inicial do Renascimento em Portugal.
Alguns dos autos foram impressos em vida do autor, sob a forma de folhetos - literatura de cordel -, mas a primeira edição do conjunto das suas obras só foi feita em 1562, tendo sido organizada por seu filho Luís Vicente. Dessa primeira Compilação não constam três dos autos escritos por Gil Vicente, provavelmente por terem sido proibidos pela Inquisição. Aliás, o Index Librorum Prohibitorum (índice dos livros proibidos) de 1551 incluía já sete das obras de Gil Vicente.
É considerado um autor de transição entre a Idade Média e o Renascimento. De facto, a estrutura das suas peças e muitos dos temas tratados são desenvolvimentos do teatro medieval. No entanto, alguns dos aspectos críticos apontam já para uma concepção humanista. Em muitos dos seus autos defende concepções e valores tipicamente medievais, no aspecto religioso, por exemplo, mas outras vezes assume posições críticas muito próximas daquelas que eram defendidas pelos humanistas europeus. Em 1531, em carta ao rei, defendeu firmemente os cristãos-novos a quem era atribuída a responsabilidade pelo terramoto de Santarém. Também no Auto da Índia apresenta uma visão anti-épica da expansão ultramarina, pondo em evidência as motivações materialistas de muitos dos seus agentes.
Não é fácil estabelecer uma classificação das peças escritas por Gil Vicente. Ele próprio dividiu-as em três grupos: obras de devoção, farsas e comédias. Na sua Compilação, Luís Vicente acrescentou-lhe um quarto género, a tragicomédia. Estudiosos recentes preferem considerar os seguintes tipos: autos de moralidade, autos cavaleirescos e pastoris, farsas, alegorias de temas profanos. No entanto, é preciso ter em conta que, por vezes, na mesma peça encontramos elementos característicos de vários desses tipos.
Herdeiro, embora, do teatro medieval, Gil Vicente vai muito além daquilo que, antes dele, se fazia em Portugal. Revela um génio dramático invulgar, capaz de procurar e encontrar soluções técnicas à medida das necessidades. Nesse sentido Gil Vicente pode ser encarado como o verdadeiro criador do teatro nacional.
Por outro lado, a dimensão e a riqueza da sua obra constituem um retrato vivo da sociedade portuguesa, nas primeiras décadas do século XVI, onde estão presentes todas as classes sociais, com os seus traços específicos e os seus vícios, bem como muitos dos problemas que preocupavam os homens do seu tempo. Também no aspecto linguístico o valor documental da sua obra é inestimável. Constitui seguramente a melhor fonte de informação de que dispomos sobre os falares do início do século XVI.
Fonte: Wikipédia
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